domingo, 7 de novembro de 2010

Kung Fu Trainee



By Leonardo Zelig

O período pós-faculdade pode ser deveras incerto quando se é despejado no mercado de trabalho sem o amparo de um contrato...de trabalho. Entre os estudos para um concurso público e outro, resolvi arriscar um programa de Trainee. O banco HSBC estava fazendo um processo seletivo e eu havia sido convocado para a penúltima etapa do processo: uma dinâmica de grupo em São Paulo.

Mala pronta, webjet e lá estou eu andando de terno pela Avenida Paulista em pleno meio dia numa sexta feira calorenta. Me dirijo ao prédio, perto da GAZETA, aonde seria realizada a dinâmica. Logo no elevador dou de cara com o ilustríssimo apresentador Milton Neves em seu horário de almoço, aceno para ele com a cabeça e subo até o décimo andar. As portas se abrem e me deparo com um extenso corredor sombrio que leva até uma produtora de eventos (local aonde ocorreria a dinâmica). Me dirijo à secretária e ela pede encarecidamente que eu sente em um dos sofás da sala de espera até chegar a hora da atividade, já que eu havia chegado com uma hora de antecedência...

Passados 30 minutos, aparece uma bela moça loira que também acaba sentando ao meu lado. Lado a lado com ela, começa a passar pela minha cabeça: “Será que nessas situações você deve virar amigo dos seus concorrentes?”, ou “Deve-se ficar na sua?Ou interagir?” e “mas, ela é tão gatinha...Será que vale um flerte?Nunca mais vou vê-la...”. Já naquela situação constrangedora de eu e ela, sem assunto, olhando pra parede branca, tento quebrar o gelo com um “small talk”:

-Você veio participar da dinâmica do HSBC? – (Pergunta retardada)

-Vim...Sou lá de Curitiba...E você?

-Sou de Brasília...Pois é,né?

-É...

-Você tá pleiteando vaga de qual curso?

-Psicologia. Quero trabalhar no Recursos Humanos.E você? - pergunta ela “demonstrando” interesse.

-Direito, área Legal do HSBC.

-Bacana!...Tá quente aqui,né? –(Quando esse comentário é proferido por qualquer pessoa em um diálogo, há grande chance da interação estar morta, o assunto “clima” deve ser abordado em último caso, quando não existe mais nenhum tema a ser trazido para o papo. Ela foi um pouco precipitada ao puxar essa budega...).

-Tá quente mesmo...

Eu, a loira e um engenheiro fomos posicionados numa salinha, COM AR CONDICIONADO, quando começou a enrolação de apresentação de cada um dos candidatos para o grupo: o que você faz da vida -Profissão - Curso - Hobbies...Me apresentei e logo em seguida a Loira contou sua história de vida, basicamente ela era psicóloga, especialista em programas de trainee (este era o 15º programa que ela participava) e professora de kung fu. Como assim? Professora de Kung fu??

Eu e ela ao longo do processo fomos aniquilados pelo “engenheiro-sabe-tudo”, que, injustamente, já estagiava no HSBC e sabia de tudo e mais um pouco sobre o banco. Nada feito para mim e para a moça...Com ares de derrota, acompanhei a lutadora de kung fu até a calçada do prédio.

-Então é isso, né? –falo eu em tom deprimido.

-Eu tô puta...Eu esperava passar nessa droga...

-Que isso!Há outros programas trainee...

-Esse é o meu 15º programa, cara!Não aguento mais!! – Ela faz gesto violento no ar com os punhos cheios de hematomas.

- Você quer dar uma volta pra espairecer?Ir na Livraria Cultura logo ali, ou no MASP comigo? – Já começa a correr um filminho em minha cabeça: eu e ela aos beijos tórridos, depois praticando sexo marcial no quarto do meu hotel na Rua Augusta.

-Não!Eu vou embora!Beijo... – Sai ela antipática destruindo qualquer possibilidade de experiência comigo nas ruas de São Paulo.

Sem contrato com o HSBC e sem a garota, terminei uma micro aventura paulistana. Valeu a experiência, mas fica a dica: saiba tudo sobre a empresa aonde quer trabalhar, seja desinibido e não crie fantasias com sua concorrente de vaga de emprego, especialmente se ela luta kung fu. Caso contrário, só vai levar porrada!